O Mundo em 2040, Courrier Internacional

O Mundo em 2040, Courrier Internacional

“Como alimentar mais de nove mil milhões de pessoas? Que fazer com os países sobrepovoados? Os mais velhos ainda terão direito a reforma? Os desafios que o planeta enfrentará, em 2040, são enormes. Crescimento demográfico, urbanização galopante, aquecimento global, escassez de recursos.

  1. Em 2040, a população mundial deverá ultrapassar os nove mil milhões de habitantes. Mais de metade da Humanidade viverá na Ásia Oriental e Meridional. A Europa representará menos de 8% da população mundial.
  2. Daqui a 25 anos, os sistemas de segurança social, designadamente o pagamento de pensões de reforma, afundar-se-ão e a crise da dívida ameaçará todas as economias.
  3. Em 2040, quando metade dos baby boomers (nascidos após a II Guerra Mundial) já cá não estiver, haverá um cataclismo. Nos Estados Unidos os fundos da segurança social estarão esgotados e será preciso cortar benefícios e prestações sociais aos reformados.
  4. Segundo um estudo, em 2050, um europeu em cada dez será muçulmano.
  5. Nos Estados Unidos, um em cada seis americanos declara-se ateu, mas em 2050 esta proporção poderá chegar a um em cada quatro, segundo um estudo recente do Instituto Pew Research Center.
  6. Segundo as previsões do Pew Research Center, a população mundial irá crescer 35% até 2050. A manter-se constante a sua taxa de fertilidade, será a população muçulmana a registar o maior crescimento (+73%). Ainda assim os cristãos continuarão a ser maioria a nível mundial.
  7. Até 2040 a ciência terá dado um salto gigantesco. Tudo o que dissermos será registado para sempre, o real e o virtual confundir-se-ão, acederemos à internet através de auriculares e algumas pessoas valerão três mil milhões.
  8. Duas tendências convergem para que desponte a “tecnologia consciente”: por um lado, o ambiente que construímos torna-se tão inteligente que parece ganhar consciência; por outro, a integração da tecnologia no nosso próprio corpo avança de tal forma que poderemos estar à beira de nos transformarmos em ciborgues (seres humanos enxertados com partes mecânicas).
  9. Nas próximas décadas cada um de nós será capaz de adquirir mais capacidades psicológicas e cognitivas da mesma forma que hoje instalamos novos componentes nos nossos computadores. Estas tecnologias oferecer-nos-ão capacidades superiores e farão a ligação directa do nosso cérebro a redes de informação e de inteligência artificial.
  10. À medida que as ligações entre humanos e máquinas se estreitarem, a distinção entre ambos esbater-se-á.
  11. A História ensinou-nos que as civilizações necessitam de uma “ligação perceptiva” para assegurar a sua coesão, seja sob a forma de mitos religiosos ou de histórias sobre as nossas origens e o nosso destino. A noção de um circuito de retorno (feedback loop) entre consciência e tecnologia pode fazer-nos evoluir para uma civilização mais esclarecida. Uma ligação percetual contribuiria para harmonizar todas as culturas do mundo no seio de uma civilização mundial.
  12. A evolução da inteligência artificial arrisca-se a escapar ao controlo humano, podendo ter efeitos positivos ou negativos. Tratados e organizações procuram, há décadas, regular e conter a capacidade destrutiva das pequenas e grandes potências, mas quem controlará a ameaça dos Simad (single individual massively destructive)?
  13. O aumento da autonomização eliminará uma boa parte das tarefas hoje efectuadas por humanos. Os veículos autónomos dispensarão motoristas de táxis, autocarros e camiões. Os robôs de cuidados médicos substituirão enfermeiros e pessoal de apoio. Com a inteligência artificial a atividade humana tornar-se-á pouco mais do que supérflua em domínios como o direito e a investigação científica.
  14. Haverá robôs em todo o lado. Nas fábricas, nos hospitais, nos restaurantes, nos hotéis… É o que nos espera em 2020 garante Scott Gray, relembrando os milhares de droides que estão a ser desenvolvidos para as diferentes indústrias.
  15. A tecnologia vai alterar a nossa forma de cultivar alimentos, declara Scott Gray. Graças aos robôs, à autonomização, à hidro e aeroponia, mas sobretudo à revolução dos LED, brevemente poderá haver agricultura em qualquer lugar, nomeadamente nas cidades onde residirão 80% das pessoas. Estes alimentos cultivados sem sol nem pesticidas, mas banhados por luz artificial cujo comprimento de onda será especificamente selecionado para um crescimento ótimo, devem chegar aos nossos pratos até 2025.
  16. Os “homens aumentados” estarão por todo o lado até 2035. Próteses, implantes, chips… A medicina integrará a tecnologia no nosso corpo e no nosso cérebro para os reparar, mas também para melhorar o desempenho de todos os que estiverem em condições de pagar por esses brinquedos.
  17. Os nossos aparelhos digitais passarão por lentes de contacto, implantes auditivos inteligentes capazes de comunicar com a nossa roupa. E este outro mundo digital estará directamente acessível graças à realidade aumentada, que sobrepõe em tempo real as informações digitais ao nosso mundo físico. A questão de fundo é saber se ainda seremos capazes de discernir entre o que é real e o que é “aumentado”.
  18. Grande parte do que dissermos será publicado na internet. Uma massa insondável de saber e cultura, opinião é reflexão será tão facilmente acessível como qualquer artigo ou comentário. Pensemos na forma como hoje consultamos o correio electrónico. O que dissermos estará disponível da mesma forma. “Mostrar todas as conversas com o Miguel anteriores à janeiro do ano passado!”
  19. Estamos finalmente a perceber que o trabalho já não é um imperativo de sobrevivência biológica. Enviar mensagens de correio electrónico todo o dia num escritório nada tem que ver com a atividade de caçador-coletor de que dependia a sobrevivência dos nossos antepassados.
  20. O empregado-modelo do futuro terá mãos biónicas e cérebro superpotente. Sem sair de casa, trabalhará simultaneamente para várias empresas, de Nova Iorque a Singapura, e ainda terá de estar atento à concorrência dos robôs.

O mundo em 2040, ou seja, daqui a uma geração:

EUA

Nos Estados Unidos, o sistema governamental e os instrumentos de política externa serão instrumentalizados por clãs que lutam pelo poder. Já não procuraram coordenar-se com os seus aliados, pelo contrário exercerão pressão sobre estes e utilizá-los-ão para responder aos seus interesses imediatos.

Europa Ocidental

A União Europeia pode afundar-se mas um eixo franco-alemão ou uma liderança alemã sobre países-satélites verificar-se-á a partir de Berlim. A UE continuará a ser um dos principais destinos dos refugiados vindos de África, Médio Oriente e Ásia (mais de um milhão de pessoas por ano). Haverá tendência para o desmembramento de países do Velho Continente com a independência das regiões mais prósperas (Escócia, Catalunha, Véneto, Flandres, etc.). Isto a par do enfraquecimento das instituições de Bruxelas em benefício da descentralização. Uma nova guerra fria com a Rússia não é de todo descartável. Os muçulmanos vindos de África e do Médio Oriente constituem entre 15 e 20% da população europeia. Aumento de zonas reféns m da doutrina onde a vida se rege pela lei islâmica: serão aos milhares e albergarão milhões de pessoas. O espaço Schengen vai ser abolido por causa do fluxo de migrantes. Os judeus abandonarão a Europa e partirão para Israel e para os EUA. Os países dos confins da União Europeia (Grécia, Itália, Espanha) tentarão conter o fluxo migratório por via militar erguendo muros.

Rússia

Elevado nível de corrupção, baixíssimo grau dos quadros superiores. O país evoluirá para um modelo latino-americano: as forças de segurança, as autoridades políticas e o crime organizado estarão imbricado; agravam-se cada vez mais as diferenças de desenvolvimento das regiões. O nível de contestação continuará baixo. O país atrairá milhões de refugiados da Ásia Central e do Cáucaso do Sul: estes migrantes contribuirão para a islamização do país. A Rússia tornar-se-á um importante exportador de armas e de drogas no mercado mundial.

Cáucaso e Ásia Central

Escalada do islamismo radical com colapso dos Estados. Possível regresso da organização da sociedade à forma de clã, com elevados níveis de corrupção, poder oligárquico, tráfico de droga e ameaças terroristas relevantes. Declínio da agricultura devido às alterações climáticas, destruição dos ecossistemas, conflitos fronteiriços gerados pela partilha dos recursos hídricos.

Médio Oriente

Enfraquecimento da soberania de todos os Estados com exceção do Irão, Turquia e Israel. Desagregação do Iraque, da Síria e da Arábia Saudita. Igual cenário para o Afeganistão e, eventualmente, Paquistão. Criação de entidades territoriais díspares curdas, drusas e alauitas. Corrida ao armamento, incluindo nuclear; Reforço político do islamismo radical: consolidação do poder nas zonas dominadas por grupos armados sunitas, como o Daesh no Médio Oriente. Guerra total entre xiitas e sunitas por toda a região. Genocídios contra as minorias religiosas e étnicas. Democracia islâmica como único modelo político, com excepção de Israel e da República de Chipre. O Irão e a Turquia serão imperialistas e concorrentes pela liderança do mundo islâmico.

África Negra

Aparecimento de territórios não reconhecidos internacionalmente. Corrida aos armamentos, incluindo atómicos (África do Sul e Nigéria). Fixação territorial do islamismo radical, sobretudo por zonas ocupadas por grupos armados sunitas, como o Boko Haram ou a milícia Shabaad. Guerras santas entre cristãos e muçulmanos. Declínio da agricultura, agravado pelas alterações climáticas. Fome, epidemias, desertificação, destruição irreversível de ecossistemas. Crescimento demográfico exponencial associado a uma descida bruta do nível de vida devido à escassez de recursos naturais.

China

Dentro de 25 anos a China será uma super-potência concorrente dos EUA em termos de influência. Poderio militar (exceptuando as armas nucleares) comparável ao dos EUA, com um número de efectivos maior. Aumento do nível de vida e do custo do trabalho, mesmo continuando a China a ser a “fábrica do mundo”. Modernização da agricultura e da indústria, desenvolvimento das reformas da educação e das ciências. Conquista do espaço. Paralelamente, agravamento dos problemas ecológicos em todo o país.

América Latina

Parceira e concorrente dos EUA. Vários movimentos paramilitares e terroristas, tráfico de droga e criminalidade. Corrida ao armamento, incluindo nuclear. Crescimento da produção industrial e da agricultura, exploração de recursos naturais e do turismo em paralelo com um aumento de produção e de exploração de energia. Agravamento dos problemas ecológicos.

 

Excertos retirados do periódico “Courrier Internacional – Os Dias do Amanhã”, setembro 2016