“Na América, o tribalismo está vivo e de boa saúde. Há quatro tipos – de classe, de ideologia, de região e de raça. Em primeiro lugar o de classe. É bastante fácil. Gente rica e gente pobre.
Em segundo lugar, o de ideologia. Liberais e conservadores. Não discordam meramente em questões políticas, cada um dos lados acredita que o outro é malévolo. O casamento entre tribos é desencorajado e nas raras ocasiões em que acontece é considerado digno de nota. Em terceiro lugar, a região. O Norte e o Sul. Os dois lados combateram numa guerra civil e persistem nódoas difíceis dessa guerra. O Norte despreza o Sul, enquanto o Sul sente ressentimento pelo Norte. Finalmente, a raça. Há uma escala de hierarquia racial na América. A raça branca está sempre no topo, especificamente os Brancos-Anglo-Saxões Protestantes, também conhecidos pela sigla WASP, os Negros Americanos estão sempre no fundo da escala e o que fica entre os dois extremos depende do tempo e do lugar. (Ou, como dizem aqueles versos maravilhosos: If you’re white, you’re all right; If you’re brown, stick around; If you’re black, get back!)
Os americanos partem do princípio de que toda a gente compreende o seu tribalismo. Mas demora algum tempo a apreender tudo. Por isso, na faculdade tivemos a visita de um palestrante, e uma colega da turma segredou a outra: «Oh, meu Deus, ele parece tão judeu!» com um estremecimento, um estremecimento de facto. Como se ser judeu fosse uma coisa má. Não percebi. Tanto quanto eu via, o homem era branco, não muito diferente da própria colega da turma. Judeu, para mim, era algo vago, algo bíblico. Mas aprendi rapidamente. Sabem, na escala de raças da América, judeu é branco mas também alguns degraus abaixo de branco. Um pouco confuso, porque eu conhecia uma rapariga com cabelo da cor da palha e sardas que dizia que era judia. Como é que os americanos conseguem distinguir quem é judeu? Como é que a minha colega de turma soube que aquele tipo era judeu? Li algures que as universidades americanas costumavam perguntar aos candidatos o apelido da mãe, para se certificarem de que eles não eram judeus, porque não admitiam estudantes judeus. Então, talvez seja assim que se sabe, com base no nome das pessoas? Quanto mais tempo se está cá, tanto mais se começa a compreeder.
De todos os seus tribalismos, aquele com que os americanos se sentem mais desconfortáveis é com o da raça. Se estivermos a ter uma conversa com um americano e quisermos discutir algo que achamos interessante relacionado com a raça e o americano disser: “Oh, é simplista dizer que é a raça, o racismo é tão complexo”, isso significa que ele quer mas é que nós nos calemos. Porque é claro que o racismo é complexo. Muitos abolicionistas queriam libertar os escravos, mas não queriam negros a viver nas redondezas. Muitas pessoas atualmente não se importam de ter uma ama negra ou um motorista negro. Mas importam-se é muito com um patrão negro. O que é simplista é dizer “É tão complexo”. De qualquer maneira, calem-se, especialmente se precisam de um emprego ou de um favor do americano em questão.
A diversidade significa coisas diferentes para pessoas diferentes. Se um branco disser que um determinado bairro tem diversidade, quer dizer que tem nove por cento de negros. (Mal chega aos dez por cento de negros, os brancos mudam-se.) Se um negro disser que um bairro tem diversidade, está a pensar em quarenta por centro de negros.Por vezes, dizem “cultura” quando querem dizer raça. Dizem que um filme é para o público em geral quando querem dizer que “os brancos gostam dele ou foram quem o fez”. Quando dizem “urbano” querem dizer negro e pobre e possivelmente perigoso e potencialmente excitante. Com “carga racial” significa que não se sentem à vontade para dizer “racista”.”
Chimamanda Adichie, in “Americanah”, 2013